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quarta-feira, 23 de setembro de 2015

sessão da tarde

eu ainda procuro saber. ajuda na minha falsa sensação de controle. tudo o que ele escreve aparece pra todo mundo que me conhece, gente que convive comigo. depois que você passa anos com uma pessoa, fica dificil separar os universos. são muitas pessoas em comum. o que ele escreve, as fotos que publica. todo mundo vê. todo mundo sabe. tendo visto e já sabendo, as pessoas me encontram. então, eu preciso estar preparada. eu preciso saber. eu não posso receber esse tipo de informação sem estar preparada. eu não posso correr o risco de alguém me contar. eu não posso correr o risco de não saber como reagir a esse tipo de informação assim. eu preciso me proteger. de mim mesma. dos meus sustos. 

durante quase quatro anos eu imaginei como seria esse dia. o dia em que ele me apareceria com uma caixinha, eu abriria e diria sim, sem nem pensar duas vezes. quando a viagem virou uma realidade inevitável, eu fantasiei que ele me pediria antes de ir, pra selar que era isso que a gente queria, mesmo com a distância. ele não pediu. ele nunca pediu.

eu lembro da primeira vez que ele me disse que eu era a pessoa com quem ele queria ter filhos. acho que foi ali que eu me casei com ele, dentro da minha cabeça. o resto foi o resto, foi consequencia, foi a vida que eu fui floreando em torno da gente e daquele futuro todo que a gente tinha.

estranho, estranho mesmo, é ver o anel que eu tanto quis nas mãos de outra pessoa. o sorriso feliz, a mão estendida mostrando pra todo mundo. a cidade ao fundo. senti um frio gelado me correr pelas costas. meu coração escorreu e parou no chão. o mesmo chão que enche de cacos vez por outra. e faz aquele barulho estridente de vidro quebrando quando eu piso.

pisei nuns cacos ontem, depois da foto. tive vontade de chorar. pensei nos filhos que a gente não teve, no anel que nunca veio pra mim durante aqueles anos. ele nunca me pediu em casamento, ele sempre deixou pra depois, sempre hesitou, nunca foi a hora certa. 

não é que ele não queria se casar. ele não queria se casar comigo.

penso em harry e sally, e em todas aquelas comédias românticas que a gente cresceu assistindo na sessão da tarde, que a mocinha começa a história chorando porque o ex namorado pediu a nova namorada em casamento depois de poucos meses de namoro. penso que eu sou uma delas, que de fato a minha vida parece um filme do cameron crowe. e de repente eu sou o centro dessa história que nem é mais minha. é dele. é deles. uma luz meio amarelada, a trilha sonora acertada, o choro preso na garganta.

o sorriso decepcionado de quem de vez em quando ainda custa a acreditar que é assim que as coisas aconteceram. 

a vida, né? 

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

cura. cura?

esse é um post que eu ensaio há tempos. eu nunca chego a lugar nenhum com o que eu quero dizer, e eu nem sei se de fato há algo que eu ~queira~ dizer. são essas minhas tentativas de organizar as ideias, a cabeça. aí, amiguinhos, eu penso que se nem em, deixa eu pensar, estamos em setembro de 2015, tudo foi em novembro, OH MY GOD 10 fucking meses de terapia intensiva, divã e freud na veia, eu consegui organizar as ideias, é muita pretensão minha achar que aqui isso vai ser diferente.

daí eu lembro do outro blog, e como tudo fluía. do quanto que escrever é hábito, do quanto que escrever é processar, é repetir, é elaborar. e eu volto a achar que eu só precisava retomar a antiga coragem, a falta de medo de ser lida, de ser exposta.

eu aqui. a vida. essa montanha russa.

***

na imensa maioria das vezes eu acho que estou ok. sendo bem racional, eu estou ok, super ok. a vida se reorganizou de um jeito incrível. pacote completo. salário legal, planos, namorado. realização profissional. eu nem gasto tanto tempo pensando no ex. sim, eu ainda penso. acompanho a novelinha mexicana com a namorada que parece legal, o corte de cabelo e os óculos equivocados. a única regra realmente séria que eu me impus em 2015 foi não estar aqui em setembro. porque seria a data da volta, ~de quando eu acreditava que a gente ia finalmente fazer planos olhando pra um mesmo lugar~. setembro de 2015 começou a existir pra mim muito antes de ser 2015. ele ia voltar, a gente ia comemorar o aniversário, quem sabe mudar de casa e ser uma família. 

eu olho pra essa versão de mim e fico meio apavorada. tenho vontade de viajar no tempo e pegar na minha própria mão lá em 2013, 2014. quem sabe 2012 ou mesmo 2011, quando tudo estava bem no comecinho e eu começava a acreditar que já sabia como seria o resto da minha vida. eu diria pra essa versão antiga de mim. menina, não faz isso com você. olha ele sendo egoísta e não deixando nenhum espaço para sonhos em comum. olha ele nem te deixando pensar em como seria o futuro. olha ele reclamando que a sua blusa nova tem um decote, ou que você não combina com o casaco de brilhos que podia chamar atenção, e nem com a lingerie de renda. olha você ficando quadrada e preto e branco, sem decotes e sem graça. eu diria pra essa versão pra correr. pra lembrar como tudo era antes. não tem amor que pague isso, que substitua. corre. a vida e acerta, a vida pode ser boa.

na minoria das vezes eu abro o histórico de mensagens. daqui nove dias, aniversário daquele dia do aeroporto. eu quis tanto este setembro. eu vivi pra ele. mesmo quando acabou, quando este setembro deixou um gosto amargo na boca, ainda assim houve expectativa. o que vai acontecer? ele volta? as pessoas começaram a me perguntar, e eu sinceramente não sei. eu tratei de me dar de presente um bom setembro para esperar. férias. nova iorque. eu fico mesmo muito contente comigo pela decisão tomada lá atrás. eu penso na mala, eu penso em deixar tudo organizado no trabalho, eu penso numa bicicleta atravessando a ponte do brooklyn. quando eu abri o histórico e caí naqueles primeiros dias, a mesma dor, o mesmo choro. a diferença é que eu paro de chorar mais rápido. penso que a vida é assim, a gente se quebra, a gente se cola. nunca mais vai ser como era. de vez em quando eu vou andar e vou sentir os cacos, porque eu ainda piso neles vez por outra. eu me pergunto se um dia isso vai passar, ou se é assim que é pra ser, e que eu fui muito protegida e poupada durante a minha vida pra só descobrir isso agora. na minoria das vezes eu sinto falta da sensação de ser absurdamente feliz. e aí eu me lembro de ter feito essa pergunta para a dra freud. eu consigo ser absurdamente feliz de novo? ela disse que não. mas que sim, é óbvio que eu vou ser muito feliz. a vida se ressignifica. eu me embalo nesses termos de psicanalista, entendo que essa versão colada de mim é mais forte. eu já perdi tudo. eu reconstruí. não tem nada nada nessa vida que eu ache que não dou conta de passar. 

eu sou mais forte. sou também mais cínica, mais armada, mais desconfiada. mais agarrada ao pé firme no chão, a não me deixar levar. eu tenho medo de ter perdido a capacidade de me apaixonar perdidamente por alguém. porque o perdidamente pressupõe entrega total e absoluta, sem medo das consequencias. eu tenho medo das consequencias, eu me protejo. eu vejo pessoas perdidamente apaixonadas e eu sinto inveja dessa ingenuidade. não sei se consigo de novo. talvez isso tenha sido perdido para sempre.

a cura vem aos poucos. setembro de 2015 finalmente está aqui, e eu fico sendo lembrada por esses aplicativos que contam sobre como foi esse dia em outros anos. o quanto eu fui feliz, ou o quanto eu sofri com a despedida. eu faço questão de lembrar. o luto leva um ano, e isso é a psicanálise que diz. todos os primeiros aniversários. eu estou preparada para passar agora, pelos próximos três meses, pelas lembranças mais dolorosas. a despedida, as juras, a caixa que chegou com carambolas dentro, e era ele me dizendo que tudo ia dar certo. nada deu certo, e eu nunca mais comi carambolas. não consigo. ainda me ressinto, e me pergunto se algum dia vai ser diferente. a cura vem aos poucos. ainda outro dia eu passei em frente ao trabalho do ex. não lembrei, não acompanhei com os olhos, entretida na conversa com o namorado. só me dei conta muitos quilometros depois. cura.

esbarrei na madrasta dele ontem, num restaurante. sempre me perguntei como seria se isso acontecesse, se eu teria coragem de enfrentar. andei até ela, que fingia não me ter visto, talvez por não saber como regir. abracei e cumprimentei, descobri que ela tambem se separou do pai dele. ex madrasta, agora. a mudança acabou sendo boa para nós duas, ela disse. eu concordei. eu estou bem. o tanto que é possível ficar bem depois que você entende que essas rachaduras vão te acompanhar.

e aí tem essa vida nova. a viagem é a dois. eu tenho medo da gente, eu ainda não tenho certeza de nada. eu quero. eu gosto. acho que amo. será que amo? não digo, não sei. acho que amor é palavra forte, não quero usar, desaprendi a usar. sigo assim, pisando em ovos, tateando no escuro. oscilando entre achar tudo maravilhoso e achar tudo errado. sem certeza de nada, da gente, dele, de mim. mas que certeza eu poderia ter afinal? sobra alguma certeza quando tudo o que vc tinha como certo desaba como um castelo de areia? sigo sem essas respostas. sigo me sentindo encharcada, sensivel, pronta pra passar o dia na cama lamentando a desgraça dos planos desfeitos. como é que se constroi em cima disso? dá pra viver um grande amor sendo racional? dá pra planejar uma vida, e uma casa, e uma familia, quando a gente não tem certeza de mais nada?

nova iorque em 6 dias. como sobreviver a 2014, eu me perguntei naquele 12 de setembro enquanto arrumava as malas dele. a certeza que eu tenho hoje é que sim, sobrevive-se. mas não inteira. nunca mais inteira.